Conhecemo-la desde 1960, altura em que a pílula se tornou um marco no controlo da fertilidade feminina.
Este contraceptivo hormonal atua através de um mecanismo de feedback negativo, ou seja, através das hormonas sintéticas que possui, suprime a libertação de gonadotropinas, que são responsáveis pela estimulação da produção das hormonas sexuais nos ovários, o que faz com que não ocorra a ovulação.
Assim, normalmente encontramos na pílula combinada o estrogénio sintético, sendo o mais comum o etinilestradiol1 e a progesterona sintética, o progestageno2. É importante salientar que ambas atuam como disruptores endócrinos.

Além disso, o que deves saber sobre a pílula?
Teoricamente, o objetivo dos anticoncepcionais é impedir a função hormonal reprodutiva das mulheres para prevenir uma gravidez.
Mas o que deves saber é que as hormonas reprodutivas femininas estão relacionadas a inúmeras outras funções importantes no corpo da mulher, desde o metabolismo ao sistema imunitário, passando pelo humor e pelo desempenho cognitivo.
É importante percebermos que a reprodução não é uma função à parte no nosso corpo, antes pelo contrário, a reprodução é uma das principais funções do corpo, por isso, quando interferirmos nela, interferimos com o funcionamento do organismo em geral.
Não é por acaso que o Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas, emitiram, juntamente com a Academia Americana de Pediatria um comunicado a afirmar que o ciclo menstrual deve ser encarado como um sinal vital.
O estrogénio em particular tem um papel de destaque. Ele é responsável por manter estável o ritmo circadiano3 e o equilíbrio metabólico do corpo.
Logo, quando não produzimos quantidades adequadas de estrogénio natural, existe um aumento na probabilidade de sofrermos danos cardiometabólicos4.
Além disso, os contraceptivos hormonais podem aumentar o risco de desenvolvermos depressão6 e problemas a nível do pavimento pélvico7, incluindo dor durante o ato sexual8 e diminuição da líbido9.

Repara que no que respeita à depressão, o progestagénio tem uma acção directa nos níveis de neurotransmissores, como o GABA e a serotonina.
Exemplo disso, foi um estudo que decorreu na Dinamarca, onde os investigadores seguiram cerca de 1 milhão de mulheres durante um longo período de tempo.
Durante esse período, os investigadores registaram 23.000 novos casos de depressão, com um risco de depressão 23% superior nas mulheres a tomar contraceptivos hormonais.
Se considerarmos que a incidência da depressão em Portugal é bastante elevada, este possível aumento associado à pílula é algo que devemos levar em consideração na altura de optar por um método contraceptivo.
Com isto em mente, o principal problema é o facto da maioria das mulheres usar a pílula para fins não contraceptivos, não chegando a perceber qual a causa que deu origem aos sintomas que apresentava antes de iniciar este método hormonal.
Isto porque o uso da pílula é visto quase como um ritual de passagem para a mulher que se torna fértil.
É claro que é importante que as mulheres tenham algum tipo de controlo sobre a sua fertilidade, mas precisamos te ter a perceção sobre os riscos e os efeitos secundários associados à toma da pílula.
No entanto, a decisão deve ser sempre exclusivamente tua e com conhecimento sobre toda a informação (a boa e a menos boa) que acompanha a toma dos contraceptivos hormonais.
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Referências
1. Bhandari, R., vom Saal, F. & Tillitt, D. Transgenerational effects from early developmental exposures to bisphenol A or 17α-ethinylestradiol in medaka, Oryzias latipes. Sci Rep 5, 9303 (2015). https://doi.org/10.1038/srep09303
2. Fent K. Progestins as endocrine disrupters in aquatic ecosystems: Concentrations, effects and risk assessment. Environ Int. 2015 Nov;84:115-30. doi: 10.1016/j.envint.2015.06.012. Epub 2015 Aug 11. PMID: 26276056.
3. https://eje.bioscientifica.com/downloadpdf/journals/eje/148/2/227.pdf
4. Sacco S, Ricci S, Degan D, Carolei A. Migraine in women: the role of hormones and their impact on vascular diseases. J Headache Pain. 2012 Apr;13(3):177-89. doi: 10.1007/s10194-012-0424-y. Epub 2012 Feb 26. PMID: 22367631; PMCID: PMC3311830.
6. Skovlund CW, Mørch LS, Kessing LV, Lidegaard Ø. Association of Hormonal Contraception With Depression. JAMA Psychiatry. 2016;73(11):1154–1162. doi:10.1001/jamapsychiatry.2016.2387
7. Champaneria R, D’Andrea RM, Latthe PM. Hormonal contraception and pelvic floor function: a systematic review. Int Urogynecol J. 2016 May;27(5):709-22. doi: 10.1007/s00192-015-2833-3. Epub 2015 Sep 25. PMID: 26407563.
8. Battaglia C, Battaglia B, Mancini F, Busacchi P, Paganotto MC, Morotti E, Venturoli S. Sexual behavior and oral contraception: a pilot study. J Sex Med. 2012 Feb;9(2):550-7. doi: 10.1111/j.1743-6109.2011.02597.x. Epub 2011 Dec 21. PMID: 22188640.
9. DeCherney AH. Hormone receptors and sexuality in the human female. J Womens Health Gend Based Med. 2000;9 Suppl 1:S9-13. doi: 10.1089/152460900318803. PMID: 10695868.